Por vergonha ou preconceito, as mulheres pouco falam de infecções vaginais. O problema não chega sequer a sair das quatro paredes do consultório médico, isto na melhor das hipóteses, já que muitas insistem em automedicar-se só para não partilharem o assunto com ninguém.
Infecções vaginais
As infecções vaginais (ou vaginites) são um tipo de infecção muito comum e que com frequência conduz a aconselhamento junto do farmacêutico e/ou consulta médica. A maior parte das mulheres já teve ou irá ter uma infecção vaginal pelo menos uma vez na vida. Por isso é importante conhecer os principais tipos de infecções vaginais e os seus sintomas; perceber como se desenvolvem, quais as possíveis causas e assim algumas formas de as prevenir. Porque elas podem prevenir-se! Contribuem para isso alguns gestos simples da higiene íntima feminina e a prática de relações sexuais protegidas.
A vagina é uma mucosa cujo equilíbrio e estrutura dependem, entre outros factores, de um conjunto de microorganismos, uma flora bacteriana, a chamada flora vaginal. Esta flora, de presença natural na vagina, confere-lhe algumas das suas propriedades fundamentais e assegura a defesa “da sua saúde”. Isto porque ela é a responsável pela acidez característica da vagina, e este pH ácido é a melhor defesa do órgão genital da mulher contra a agressão dos vários agentes patogénicos (fungos, bactérias, e outros).
A composição da flora vaginal e o seu equilíbrio dependem de vários factores como a idade da mulher, a fase do ciclo menstrual, a actividade sexual, a higiene e a toma de medicamentos (entre outros).
Quando madura a vagina é normalmente colonizada por uma grande variedade de espécies bacterianas, de entre as quais se destacam as espécies Staphylococcus, Lactobacillus, Streptococcus e Gardnerella vaginalis. Mas o tipo e o número de espécies que proliferam a nível vaginal são condicionados por diversos factores, nomeadamente o pH vaginal, a concentração em glicogénio e o conteúdo em glicose (estes dois últimos compostos são os substratos da flora bacteriana).
O pH vaginal normal é de 3,8-4,2, ou seja, é ácido. Este pH, que ajuda a manter equilibrada a flora bacteriana está, por sua vez, dependente dela. Isto porque ele é mantido pelo ácido láctico que é produzido pela flora bacteriana normal (isto explica que este seja um composto presente em algumas das formas farmacêuticas utilizadas para a higiene íntima feminina durante períodos de infecção vaginal, e também para prevenção).
Compreende-se assim que factores que modifiquem a acidez e/ou a flora vaginal, são factores capazes de enfraquecer as defesas da vagina. São exemplos a toma da pílula, a gravidez, a menopausa, ou uma higiene íntima deficiente ou excessiva.
Na gravidez por exemplo, há uma discreta elevação do pH da vagina o que a torna mais predisposta a infecções. O mesmo acontece durante a menstruação.
A flora bacteriana é também responsável pela limpeza da vagina, eliminando as células mortas e outros resíduos. Assim, estes elementos juntamente com o muco endocervical originam um corrimento natural e necessário, que é inodoro e claro ou branco (descarga vaginal designada por leucorreia).
As características deste corrimento (cor e espessura) alteram-se ao longo do ciclo menstrual, mas é importante que a mulher fique atenta a essas alterações porque algumas não são naturais: se o corrimento for excessivo, adquirir uma cor e/ou espessura diferentes e um odor intenso, ou é acompanhado de ardor e comichão, isso são sinais de que houve uma alteração da flora vaginal, e de que pode ter-se desenvolvido uma infecção.
Os sintomas habituais das infecções vaginais (independentemente do tipo específico de infecção ou microorganismo causador) são:
- corrimento;
- prurido;
- irritação;
- disúria (dor ao urinar);
- dispareunia (dor nas relações sexuais);
- sensibilidade, inflamação ou ferida.
São três os principais tipos de infecções vaginais responsáveis pela maioria dos casos:
- Vaginite ou vaginose bacteriana;
- Vulvovaginite fúngica ou candidíase vulvovaginal;
- Tricomoníase.
Enquanto as duas primeiras não são doenças sexualmente transmitidas, a última é transmitida por via sexual.
Com alguma frequência ocorrem também infecções mistas, ou seja, causadas por vários microorganismos.
Tricomoníase
É causada por um protozoário (Trichomonas vaginalis) e é uma infecção sexualmente transmissível. Surge geralmente na mulher jovem. São factores predisponentes, a actividade sexual, a existência de vários parceiros sexuais, a gravidez e a menopausa. Quanto aos sintomas, normalmente há um corrimento vaginal profuso ou espuma vaginal, isto é, um corrimento amarelo-esverdeado espumoso com odor desagradável e que é normalmente acompanhado de comichão. O tratamento deve ser feito pela mulher e parceiro, e durante a infecção é fundamental usar preservativo nas relações sexuais. O tratamento passa pela administração de antibióticos.
Vaginite bacteriana
A vaginite bacteriana é a infecção mais comum na mulher em período fértil. É muitas vezes assintomática (cerca de metade das mulheres com vaginite bacteriana são assintomáticas). Os sintomas, quando surgem, são um corrimento acinzentado ou amarelado com cheiro desagradável a peixe. Podem ocorrer ardor e vermelhidão locais. Normalmente os sintomas agravam-se após as relações sexuais. Alguns dos factores predisponentes a esta infecção são a gravidez, o DIU (dispositivo intra-uterino), a lactação e a actividade sexual. O tratamento passa pela administração de antibióticos.
Vulvovaginite a cândida ou Candidíase vulvovaginal
A candidíase é uma das infecções vaginais mais comuns. Estima-se que cerca de 75% das mulheres sofrem, pelo menos de uma infecção a Candida, durante a sua vida fértil. Esta infecção é provocada, na maioria dos casos, pelo Candida albicans. Este é um fungo que existe naturalmente no corpo humano, habitando a boca, a vagina, o aparelho gastrointestinal e a pele – locais onde existem condições de humidade favoráveis ao seu desenvolvimento. Ele mantém-se nestes tecidos em quantidades reduzidas, sendo inofensivo para a saúde. Contudo, sempre que surgem desequilíbrios que permitam o seu desenvolvimento, a infecção desenvolve-se, e os sintomas manifestam-se. Alguns dos factores de risco que podem causar este desequilíbrio, ou seja, predisponentes a candidíase são:
- gravidez;
- contraceptivos com estrogénios;
- Diabetes mellitus;
- terapêutica com antibióticos de largo espectro (para tratar outras infecções, como por exemplo, as urinárias);
- infecção por vírus de imunodeficiência adquirida (HIV);
- quimioterapia;
- roupa justa;
- colonização gastrointestinal;
- actividade sexual.
A candidíase vulvovaginal, apesar de envolver o aparelho genital, não é uma doença sexualmente transmissível. Contudo, e apesar disso, o homem não está imune, isto é, na verdade o contacto sexual com uma mulher infectada pode colocá-lo em risco, podendo haver migração da infecção e podendo o homem manifestar sintomas, sendo os mais frequentes a comichão e vermelhidão no pénis. Isto justifica que em muitas situações o tratamento seja feito pelo casal (apesar de que a terapêutica da candidíase na mulher não obriga ao tratamento do parceiro sexual). Por outro lado, as relações sexuais, ao aumentarem o movimento do fungo e a ocorrência de traumatismos mínimos, podem predispor para esta infecção, e além disto o sémen é um promotor do desenvolvimento e virulência do fungo.
Quanto à sintomatologia, a candidíase manifesta-se como uma descarga vaginal, ou seja, um corrimento esbranquiçado e espesso, semelhante a leite/queijo coalhado, e acompanhado por inflamação na pele vulvar (com vermelhidão e comichão no exterior da vagina e na vulva), e também por dor durante o acto sexual e ao urinar.
O tratamento envolve a administração de medicamentos anti-fúngicos de aplicação tópica ou toma sistémica. Com o tratamento adequado, os sintomas desaparecem completamente. Contudo, se o tratamento não for cumprido há o risco de a infecção voltar, podendo tornar-se recorrente.
As infecções vaginais são bastante comuns, mas podem ser prevenidas, o que exige que a mulher tome alguns cuidados, e faça uma higiene íntima adequada (mas não excessiva, porque lavagens demasiado frequentes podem deixar a mulher mais vulnerável).
Assim, aqui ficam algumas dicas:
- a higiene íntima deve ser feita apenas com água e um sabão suave;
- no máximo, devem fazer-se duas lavagens íntimas por dia;
- não são aconselhados os duches vaginais porque irritam a vagina;
-os toalhetes e os desodorizantes secam a região vaginal pelo que devem ser reservados para situações excepcionais, como viagens;
- o sentido correcto da lavagem e limpeza é da vagina para o ânus, já que assim se evita que a flora intestinal entre em contacto com a região genital;
- deve dar-se preferência a roupa interior de algodão;
- devem evitar-se as roupas apertadas porque favorecem o desenvolvimento de infecções;
- os produtos de higiene íntima devem ser utilizados pontualmente, mediante indicação médica ou aconselhamento farmacêutico.
Com estes cuidados simples podem prevenir-se as infecções vaginais.